MPF (ministério público federal) aponta Ceciliano como 'protagonista' em esquema de corrupção chefiado por Witzel
Segundo a investigação, André Ceciliano (PT) repassava ao estado as sobras de caixa da Alerj, com o pretexto de financiar secretarias municipais de saúde. Contudo, o dinheiro virava propina para membros do legislativo. Ele nega.
As investigações do Ministério Público Federal (MPF) concluíram que o deputado André Ceciliano (PT), presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), era um dos protagonistas do esquema de corrupção que desviava dinheiro público da Saúde. Segundo os procuradores, deputados, empresários e membros do governo se associaram para obter vantagens indevidas.
Indicado como chefe do esquema, Wilson Witzel (PSC), foi afastado do cargo de governador do estado por irregularidades e desvios na saúde. O vice-governador, Cláudio Castro – que assume o cargo -- foi alvo de mandado de busca.
O afastamento é uma das decisões da Operação Tris in Idem ("Três do mesmo", em latim), que até a última atualização desta reportagem tinha prendido sete pessoas -- entre elas, o Pastor Everaldo, presidente do PSC, e o ex-secretário Lucas Tristão.
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O governador e outras oito pessoas, incluindo a primeira-dama Helena Witzel, também foram denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por corrupção.
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Na avaliação do MPF, o novo esquema de corrupção tem relação com as operações Cadeia Velha e Furna da Onça. As duas investigações terminaram com oito parlamentares presos.
Alvo de mandados de busca e apreensão, Ceciliano viu, nesta sexta, policiais federais entrarem em sua casa, na Barra da Tijuca, no seu gabinete na Alerj, além de ser obrigado a entregar seu aparelho de telefone.
Wilson itzel é afastado do governo por seis meses.
Delação premiada
As conclusões do MPF estão baseadas na delação premiada do ex-secretário Estadual de Saúde, Edmar Santos, que também teria participado do acordo.
Edmar contou que a estratégia para desviar dinheiro público foi apresentada pelo presidente da Alerj. O plano consistia no desvio das sobras dos duodécimos do Poder Legislativo, o caixa da assembleia.
O dinheiro da Alerj seria transferido aos cofres do estado sob pretexto de financiar as secretarias municipais de saúde.
Além de Edmar e Ceciliano, também participaram do acordo o então governador Wilson Witzel, o vice-governador Cláudio Castro, o secretário André Moura e os deputados Rodrigo Bacellar (Solidariedade) e Márcio Canella (MDB).
Caminho do dinheiro
De acordo com os procuradores, o dinheiro passava por um longo trajeto, aparentemente legal, até virar propina nas mãos dos envolvidos.
O esquema começava na Alerj, que devolvia os valores que sobravam de seu orçamento para o tesouro estadual. Da conta única do Tesouro, o dinheiro iria para a conta específica do Fundo Estadual de Saúde.
Em seguida, os valores eram repartidos entre os fundos municipais de saúde indicados pelos deputados. Finalmente, parte das sobras de orçamento da Alerj era revertida aos parlamentares a título de propina.
Só em 2019, a Alerj fez duas "doações" ao estado, que juntas somavam R$ 106 milhões.
Municípios parceiros no esquema
O caminho do dinheiro só chegava ao fim quando encontrava as contas bancárias de municípios parceiros dos políticos envolvidos no esquema.
Segundo o MPF, era André Ceciliano que indicava para Edmar Santos os municípios que receberiam a verba do estado. São João de Meriti, município da Baixada Fluminense, por exemplo, foi um parceiro. A cidade tem como prefeito Gelson Azevedo, um aliado de Ceciliano.
As investigações dizem que a cidade recebeu, durante todo o ano de 2019, pouco mais de R$ 11,5 milhões. Já nos cinco primeiros meses de 2020, o município recebeu mais de R$ 13 milhões do Fundo Estadual de Saúde.
Em Carapebus, a diferença seria ainda maior. A cidade recebeu menos de R$ 70 mil nos últimos anos. Mas só em abril de 2020, a prefeitura local recebeu R$ 5 milhões.
A situação se repetiu em Campos dos Goytacazes. Ao longo de 2019, R$ 900 mil foi transferido para o município. Mas um único repasse feito em novembro daquele ano o valor saltou para aproximadamente R$ 11 milhões.
As cidades de Bom Jesus do Itabapoana e São Fidélis, na Região Norte Fluminense, também foram apontadas pelos investigadores como possível destino do dinheiro desviado.
Para os procuradores, as escolhas por cidades do Norte Fluminense fazem sentido, já que um dos suspeitos de integrar o esquema era o deputado Rodrigo Bacelar, que é líder do partido Solidariedade na região.
O mesmo acontece com a escolha da cidade de Campos, onde Bacelar e o próprio Ceciliano possuem interesses políticos.
Organizações Sociais
Em outro trecho da denúncia apresentada pelo MPF, os procuradores citam novamente a deleção premiada de Edmar Santos. Nesse ponto, ele fala sobre as Organizações Sociais (OSs) e como elas se encaixavam no esquema.
Segundo a delação de Edmar, as OSs que recebiam os contratos do governo já estavam comprometidas em disponibilizar vagas de trabalho para indicados políticos.
O delator informou ao MPF que 10% dos cargos em UPAs e hospitais poderiam ser oferecidos a deputados parceiros. O objetivo seria angariar apoio político para o governo.
A pessoa responsável por intermediar esses acordos seria o ex-secretário de governo e ex-chefe de gabinete de Witzel, Cleiton Rodrigues. A função também teria sido desempenhada por André Moura, outro ex-secretário.
Edmar Santos contou ainda que a OS Lagos, a OS Mahatma Gandhi e a OS Idab aceitaram currículos e empregaram funcionários indicados por parlamentares.
O outro lado
Em nota, a defesa do presidente da Alerj afirmou desconhecer as razões da busca e apreensão em seus gabinetes no prédio da Rua da Alfândega e no anexo, "mas ele está tranquilo em relação à medida e se pôs à disposição dos agentes da PF seu gabinete no Palácio Tiradentes, que não estava incluído no mandado".
"Ceciliano reitera a sua confiança na Justiça e afirma que está pronto a colaborar com as autoridades e a contribuir com a superação desse grave momento que, mais uma vez, o Rio de Janeiro atravessa. Ele também colocou seus sigilos bancário, fiscal e telefônico à disposição das autoridades."
Já o deputado Márcio Canella disse, também por meio de nota, que "tem o dever de solicitar recursos e melhorias para a população mais carente, no caso da Baixada Fluminense".
"O próprio delator diz que não liberou os recursos e jamais menciona qualquer atitude não republicana da minha parte. O que não se pode admitir é criminalizar a atuação legítima do parlamentar", disse Canella.
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